Delfina Foundation
Residência Artística realizada com apoio do Instituto Inclusartiz.2022
Durante minha residência na Fundação Delfina (2022), em Londres, me dediquei a investigar uma questão especifica que há algum tempo vem permeando meu trabalho: De que maneira o programa modernista brasileiro, desde edificações até suas plataformas de debate público (Como publicações e exposições), atualizou e perpetuou narrativas próprias as heranças coloniais no Brasil?
Assim, durante a residência optei por pesquisar catálogos e arquivos de exposições que propunham apresentar a produção modernista de arquitetura brasileira ao norte global em meados do século XX. Pesquisando em acervos como o Tate Britain, The National Archives, Galeria Whitechapel, RIBA (Royal Institute of British Architects) e na Embaixada do Brasil sobre exposições como Modern Brazilian Painting (Royal Academy. 1943), “Brasilia: the building of a new capital for Brazil” (ICA London. 1958), dentre outras.
Nesse processo, a partir do contato com a imagem icônica de uma palmeira na capa do catálogo de Brasilia: the building of a new capital for Brazil (1958), voltei minha investigação para pensar a relação que as vegetações estabeleciam com a arquitetura nas publicações e nos espaços expositivos. Ao visitar as imagens do pavilhão brasileiro na EXPO 58 (Bruxelas, 1958) disponíveis no arquivo da biblioteca do RIBA, me atentei ao modo como as plantas tropicais competiam com as fotografias de arquitetura no pavilhão. Paralelamente, após ter contato com a pesquisa em torno do projeto “The Art of Diplomacy – Brazilian Modernism Painted for War”, de 2018, (investigação realizada pela Embaixada do Brasil em Londres sobre os legados da mostra Modern Brazilian Paintings, 1944), identifiquei que Londres havia recebido do MoMA uma série de fotografias de arquitetura anteriomente apresentadas em Brazil Builds (MoMA. Nova York, 1943). Assim, me voltei a pensar a relação dessas imagens com a vegetação nessa primeira exposição em Nova York, me atentando ao fato das plantas serem apresentadas sobre displays expositivos assim como as maquetes, saindo do campo puramente ornamental para o expositivo.
A presença exuberante de uma série de vegetações exóticas ao norte global, em exposições que fundamentalmente se propunham a narrar uma ideia de “Brasil”, parecem entrar em colisão com as imagens de transformações em curso naquele período no país: como a expansão da fronteira agrícola no interior do Brasil e o avanço de obras faraônicas como a rodovia Belém-Brasília.
Assim, a apropriação de plantas tropicais nessas exposições seria sintomática as dinâmicas neocoloniais no Brasil daquele momento, no fetiche pela domesticação dessas espécies dentro dos espaços planificados da arquitetura modernista ficava velada o discurso de dominação daquilo e daqueles que era considerados selvagens. Esses espaços expositivos talvez tentassem simular a lógica dos jardins de aclimatação da Europa (Como o Jardim botânico de Kew ou o clássico Palácio de Cristal), estruturas que não só aclimatavam espécies tropicais ao clima frio, mas que tratavam de simbolizar a ampla dominação colonial através da diversidade de espécies extraídas de territórios diversos. O Brasil que se esforçava para aclimatar o repertório modernista aos trópicos, procurava também mostrar-se capaz de articular seu próprio jardim de aclimatação com espécies de seu próprio território continental, como símbolo de sua empresa auto-colonial.
Nesse sentido, durante o período na Delfina passei a estudar uma possível subtração das referências arquitetônicas presentes nos registros fotográficos dessas exposições sem intervir na presença vegetal nos espaços, procurando delinear como a presença desses elementos se dá não como uma arbitrariedade expositiva, mas como um elemento central para a manutenção de uma determinada narrativa. Esse processo vem desembocando numa série de trabalhos, dentre eles Construção Brasileira (2022) e Jardim de aclimatação (2022).